Entrevista #1 - Ricardo Santos
Essa á primeira de uma série de entrevistas que publicaremos neste espaço. Nos pareceu claro que em função do formato, precisavámos de um certo poder de síntese sem que o conteúdo fosse comprometido. Creio que alcançamos o objetivo! Avaliem, critiquem e mandem sugestões. Todas as manifestações serão bem vindas!
Mas vamos ao que interessa! Tipograficamente entrevista Ricardo Santos da Vanarchiv. (respostas em português, de Portugal!)
TGM - Como você define a atividade de design de tipos de letra?
RS - É a criação e interpretação da comunicação oral para um meio e suporte visual, com um forte carácter lingüístico e estético.
TGM - Como surgiu a idéia de criar o site "Vanarchiv"?
RS - A idéia surgiu com o objectivo de mostrar e divulgar tipos de letra e trabalhos que tenho vindo a desenvolver. Um arquivo pessoal na internet dos meus projectos tipográficos.
TGM - Em que momento e por que surgiram os projetos "Van" e "Lisboa"?
RS - Depois de ter participado em alguns projectos de sinalética senti a necessidade de desenvolver, pessoalmente, um tipo de letra e uma base gráfica para pictogramas, de forma a usar em futuros trabalhos. Assim surgiu o tipo de letra "Van" em 1998, que foi o meu primeiro tipo de letra sem serifa, com um perfil geométrico, tal como a versão dos Dingbats (pictogramas e simbolos gráficos). O tipo de letra "Lisboa" e seus Dingbats foram desenvolvidos em 2000 para serem aplicados, inicialmente, num pequeno trabalho gráfico para a revista "Palavras" (Associação dos Professores de Português de Portugal).
TGM - Qual o seu método de trabalho no desenvolvimento de projetos tipográficos?
RS - A fase de concepção inicial de um projecto varia muito, poderá surgir num desenho em papel, tal como ser desenvolvido directamente no computador. Não tenho um método fixo ou pré-estabelecido. Depois de ter a idéia base definida começo, então, a desenvolver o tipo de letra no computador através dos programas existentes para desenho de tipos de letra (FontLab e Fontographer) e faço as correcções e testes necessários até o trabalho estar pronto a ser comercializado.
TGM - Como surgiu o convite para distribuir o seu tipo "Lisboa" pela Fountain?
RS - A idéia de se distribuir o tipo de letra "Lisboa", através da editora sueca de tipos de letra Fountain, surgiu através de uma conversa entre mim e um dos designers de tipos da Fountain, Simon Schmidt, que me indicou essa Foundry para editar o trabalho. Ao contactar o proprietário e designer de tipos de letra da Fountain, Peter Bruhn, ele já conhecia o tipo de letra através do fórum da Typophile, tendo sido mais fácil chegarmos a um acordo.
TGM - Quais tipógrafos clássicos e contemporâneos que você admira?
RS - São muitos, mas faço um destaque especial aos clássicos: Francesco Griffo, Fournier, Fleischman, Goudy. Dos contemporâneos destaco Fred Smeijers, Matthew Carter, Bram de Does, Gerard Unger, Erik Spiekermann, entre outros.
TGM - Quais são suas fontes prediletas?
RS - Não tenho fontes prediletas, mas, são muitas as que admiro e respeito por motivos diferentes, faço destaque à "Univers", "Lexicon", "Sabon", "DTL Fleischman", "Meta", entre outras.
TGM - Que momento vive o mercado tipográfico em Portugal?
RS - A cena tipográfica em Portugal está, cada vez mais, em melhor forma. Não havendo uma sólida tradição tipográfica durante séculos, nos dias de hoje existem alguns designers de tipos de letra nacionais a criar novos tipos e a comercializá-los para todo o mundo. Sendo Mário Feliciano das mais fortes referências do design de tipos de letra feito em Portugal, conhecido internacionalmente.
TGM - Alguns países possuem uma forte tradição tipográfica. Você acredita que os países latino-americanos poderão ocupar um espaço próprio dentro do design tipográfico mundial?
RS - Claro que sim, neste momento paises como a Argentina, México, Chile, Brasil, entre outros, começam a surgir na cena internacional com grande força. Do pouco que conheço do panorama latino-americano, no geral, talvez tenham uma vertente mais experiemental em comparação com paises de forte tradição tipográfica (Holanda, Alemanha, França, etc). Mas, para além desta vertente mais experimental, também existem designers de tipos nestes paises a produzir projectos com grande caráter tradicional e estético.
TGM - Qual é a sua visão a respeito da criação e produção de projetos tipográficos com uso das tecnologias actuais?
RS - As novas tecnologias, nomeadamente, aplicadas ao desenho e à edição de tipos de letra em formato digital, vieram trazer uma maior rapidez de concepção e poder criativo aos typedesigners. Essas tecnologias ao expandirem-se e ao serem comercializadas por todo o mundo criaram uma maior uniformização destas ferramentas de trabalho ao nível global. Estas novas tecnologias, a meu ver, são ajustadas aos dias de hoje, visto estarem bastante desenvolvidas e completas possibilitando novos desafios aos designers.
TGM - Fale um pouco sobre o workshop ("Big type / Small type") conduzido por você no IADE (Instituto de Artes Visuais, Design e Marketing - Portugal).
RS - O workshop (Big type / Small type) foi realizado por mim, juntamente com Ruben Dias, e foi uma experiência muito interessante. Exploramos inicialmente o contexto histórico e presente desta actividade, para que os alunos tivessem uma percepção teórica, só depois passamos ao lado prático, onde cada um desenhou e explorou técnicas caligráficas. Por fim, foi escolhido um dos tipos de letra para ser desenvolvido e editado num formato digital.
TGM - Quais são os seus planos para o site "Vanarchiv"? Quais os tipos que estão na linha de produção?
RS - Espero que num futuro próximo o site "Vanarchiv" possa se tornar numa pequena empresa para vender directamente os meus tipos de letra, controlando todo o processo desde a criação à comercialização. Para breve irei editar o meu primeiro tipo de letra serifado a "Atlantica". Já estão terminadas as novas versões do projecto "Lisboa" e vão ser comercializados também em breve os novos estilos tipográficos (Lisboa Condensed, Lisboa Book, Lisboa Swash, Lisboa Slab Serif).
TGM - O que o motiva a continuar a produzir novos tipos de letra?
RS - Para além de gostar muito de desenhar e explorar novos desafios tipográficos é, também, uma forma de deixar a minha marca pessoal num contexto nacional e internacional.
TGM - Fontes de texto ou display? Legibilidade ou experimentação? Em que está focada a sua filosofia de trabalho tipográfico?
RS - Confesso que, nestes últimos anos, tenho desenvolvido projectos com um carácter mais funcional do que experimental. A fronteira que separa um tipo de letra de texto para uma versão display é algumas vezes grande, mas gosto particularmente de trabalhar em tipos de letra para corpos reduzidos. A minha filosofia de trabalho centra-se no design de tipos de letra com um carácter mais tradicional onde tento explorar, aos poucos, as várias possibilidades tipográficas possíveis (tipos para texto, display, famílias tipográficas, estilos tipográficos, etc).
TGM - Qual sua opinião sobre a pirataria de fontes? Quais os cuidados que a você toma para não ser alvo dessa prática?
RS - A minha opinião em relação à pirataria é a seguinte: acho que os profissionais e/ou todos os que ganham dinheiro através da utilização de fontes, softwares, etc, devem pagar a sua utilização. É importante sermos honestos com os outros que vivem destas actividades para contribuir economicamente numa cadeia que está interligada de forma muito directa. Se toda a gente me piratear as minhas fontes não será possível eu viver exclusivamente desta actividade, e o mesmo acontece aos criadores de softwares. Eu comprei um software de edição de tipos de letra para desenvolver o meu trabalho e foi a minha forma de devolver ao mercado uma parte do dinheiro que ganho ao utilizar esses produtos, sem os quais não conseguiria realizar os meus projectos com rapidez e perfeição. Os cuidados que tenho são poucos visto ser muito fácil um tipo de letra entrar no mercado pirata, sendo impossível evitar que isso aconteça. Sempre que posso, tento sensibilizar os designers para esta ética profissional e econômica.
TGM - Quais os conselhos para ser um bom designer de tipos. Palavras Finais.
RS - Creio ser importante ter-se uma consciência do percurso histórico desta actividade de forma a se compreender o nosso papel criativo nos dias de hoje. Para além desta vertente, teórica e histórica, é também importante haver um complemento técnico ao nível da utilização das linguagens e ferramentas de trabalho. Tudo isto envolve muitas horas de leitura variada, com o objectivo de se complementar toda uma aprendizagem. Para quem possa, aconselho a estudarem em escolas especializadas e com grande tradição tipográfica (Holanda, Inglaterra, etc), onde poderão aprender bastante sobre esta actividade.
Links relacionados:
Vanarchiv
Fountain
MyFonts
IADE
1 Comments:
Força aí ricardo :P Que venham aí muitas mais fontes!
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